quinta-feira, 14 de janeiro de 2010

Liberdade de expressão

Assim disse o Casoy

Nas últimas eleições para Presidente da República, de 2006, em debate ao vivo na TV, o jornalista e apresentador Boris Casoy afirmou categoricamente que o Lula seria reeleito porque os nordestinos eram alienados, que não tinham acesso aos meios de comunicação e que, portanto, sequer sabiam o que estava acontecendo no resto do país. Eu, que acompanhava o debate para ver o desempenho dos candidatos nas urnas, quase caí para trás quando ouvi a declaração do apresentador, que é reconhecidamente um dos mais gabaritados da TV brasileira.

Em sua infeliz declaração, o jornalista fez subentender que se dependesse apenas dos eleitores das regiões sul e sudeste, o Lula dificilmente seria reeleito porque esses eleitores são mais esclarecidos, têm mais acesso aos meios de comunicação etc., diferentemente, portanto, dos eleitores nordestinos, no dizer dele verdadeiros boçais. Ironicamente, porém, terminadas as eleições, quem aparece eleito deputado em São Paulo? Ninguém menos que Paulo Maluf, aquele mesmo que meses antes das eleições passara vários dias na cadeia por conta do antigo processo por apropriação indébita de verbas públicas que o governo de São Paulo move contra ele. O mesmo Maluf do velho e conhecido bordão “roubo, mas faço!”. Cabe então perguntar ao Casoy de onde ele tirou a teoria de que os eleitores do nordeste são alienados e os do sul e sudeste esclarecidos. Será que os eleitores do nordeste elegeriam o Maluf? Para mim está claro de onde ele tirou a teoria: da sua soberba, da sua visão preconceituosa. Soberba e preconceito que ficaram escancarados de vez em outra declaração infeliz do apresentador, dessa vez em episódio mais recente. Em 31 de dezembro de 2009, após uma vinheta do Jornal da Band, chamando o intervalo comercial, sem saber que o áudio ainda estava sendo transmitido, Casoy comentou as imagens exibidas anteriormente, que mostravam uma dupla de garis desejando felicidades aos telespectadores da emissora. Assim disse o Casoy: "Que merda: dois lixeiros desejando felicidades... do alto de suas vassouras... dois lixeiros... o povo mais baixo da escala do trabalho...".

Mas não é só o Casoy que desfila diante das câmeras as suas infelizes frases discriminatórias. Quem não se lembra daquele episódio em que os índios receberam a golpes de facão um funcionário da Eletrobrás que foi lá no Rio Xingu, no Pará, para dar uma palestra sobre usina hidrelétrica? Pois bem, o apresentador do Jornal da Globo, cujo nome me foge agora, ao comentar o acontecido, disse em alto e bom tom: “esses índios são mesmo uns selvagens!”. Alto lá, senhor apresentador! Voltemos um pouquinho no tempo e o senhor verá que os índios eram os legítimos donos da Terra Brasilis. Não só de um pedacinho de terra lá do Pará não, do país inteiro. Nós, os “civilizados”, como o senhor fez supor, roubamos o país deles e os dizimamos, violentamos suas mulheres, corrompemos seus filhos. Bom, mas paremos por aqui. Para saber mais a respeito do quanto sacaneamos os índios é só pesquisar na internet ou fazer uma breve incursão nos livros de História. Então, quem são os selvagens mesmo?

Que o cara tenha suas próprias opiniões, tudo bem, é um direito de todos, mas é dever de cada jornalista (e os jornalistas sérios e profissionais hão de concordar comigo), pensar bem antes de emitir opiniões preconceituosas e discriminatórias. Afinal, num estado democrático de direito, o jornalista é uma das figuras mais importantes. Sou a favor da liberdade de expressão sim, mas para os jornalistas sérios e profissionais, que estudam a história, que pesam bem os fatos antes de emitir sua própria opinião diante das câmeras de TV ou na mídia impressa. Mas não podemos de forma alguma permitir que os jornalistas de meia-tigela ocupem espaço na TV para expor os seus preconceitos, os seus bairrismos, as suas rixas político-partidárias. Liberdade sim, mas com responsabilidade, como sempre nos ensinaram os nossos avós.

Um comentário:

  1. O preconceito está onde menos imaginamos. Sempre tem alguém se julgando melhor que os outros, não pela grandeza do espírito, mas pelo que carrega na carteira. Digamos ao senhor Boris Casoy sonseguiu ir mais baixo não na cadeia de profissões porque todas são importantes, mas sim na baixeza de espírito.

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